CJ: Boa tarde, Sr. João Menezes! Muito obrigado por se disponibilizar para dar esta entrevista.
Para começar, pode contar-me um pouco sobre si?
CJ: Boa tarde. Chamo-me João Menezes, resido no concelho de Castelo de Paiva, tenho 76 anos e atualmente estou reformado.
CJ: Ótimo. Agora, gostaria de ouvir um pouco sobre si há 50 anos. Pode contar-me como era a realidade social durante o tempo de Salazar e da Ditadura?
João Menezes: Claro, se a minha memória ajudar. Naquela época, vivíamos sob um regime autoritário. A liberdade era limitada e havia um forte controlo por parte do Estado sobre a vida das pessoas.
CJ: Que experiências específicas viveu durante esse período?
João Menezes: Tive algumas experiências marcantes. Fui preso pela PIDE durante três meses, acusado injustamente de contrabando de produtos para Espanha. Fui também espancado na rua à frente dos meus familiares, simplesmente por expressar opiniões contrárias ao regime. Além disso, tive amigos que desapareceram e nunca mais ninguém soube deles, provavelmente vítimas do regime.
CJ: Como era ir para a escola naquela época?
João Menezes: Ir para a escola era uma experiência controlada. Havia um ambiente de disciplina rígida, e éramos constantemente vigiados. Os quadros dos representantes máximos da nação estavam presentes em todas as salas, juntamente com o crucifixo.
CJ: E nos fins de semana, o que gostava de fazer?
João Menezes: Nos fins de semana, tentava relaxar e passar tempo com a família. Mas sempre com um certo receio, pois nunca sabíamos quando poderíamos ser alvo de vigilância ou represálias.
CJ: Que tipo de trabalhos realizava naquela época?
João Menezes: Trabalhava principalmente na agricultura, ajudando os meus pais nas tarefas do campo. Era uma vida dura, mas estávamos habituados a trabalhar desde cedo.
CJ: E quanto à alimentação naquela época, como era?
João Menezes: A alimentação era bastante simples. Não tínhamos acesso a muitos produtos importados, por isso a nossa dieta era baseada principalmente em produtos locais, como pão, azeite, e vegetais cultivados no nosso quintal.
CJ: O senhor possuía amizades ou namoradas naquela época?
João Menezes: Sim, tinha amigos próximos, mas sempre com cautela devido ao clima de desconfiança que se vivia. Quanto a namoradas, era difícil manter relacionamentos duradouros, pois muitas vezes as pessoas desapareciam sem deixar rasto ou tinham receio de comunicar, dado que não havia a liberdade que há hoje.
CJ: E sobre o sistema de saúde, como é que funcionava?
João Menezes: O acesso aos cuidados de saúde era limitado. Tínhamos médico de família, mas muitas vezes as consultas eram rápidas e superficiais. Não era incomum ter que esperar semanas ou meses por uma consulta.
CJ: As pessoas falavam abertamente sobre a realidade política e social, ou havia receio de serem presas?
João Menezes: Havia um grande receio de falar abertamente sobre política. As pessoas sabiam que podiam ser vigiadas e denunciadas a qualquer momento, por isso muitas vezes evitavam falar sobre assuntos sensíveis em público.
CJ: O senhor frequentou a escola? Até que anos de escolaridade? Como eram os professores naquela época?
João Menezes: Sim, frequentei a escola até um certo ponto. A educação era valorizada, mas muitas vezes limitada pela falta de recursos e pela orientação política do regime. Os professores eram respeitados, mas também eram vistos como agentes do Estado, responsáveis por transmitir a ideologia do regime aos alunos. Como éramos pobres, tínhamos de trabalhar no campo e ajudar no sustento da família, porque tínhamos de sobreviver com poucos recursos e não era possível ir sempre à escola.
CJ: Que rotinas tinha o seu avô naquela época?
João Menezes: As rotinas eram bastante simples. Trabalhava durante a semana, por vezes, ia à escola, e nos tempos livres tentava aproveitar ao máximo o tempo com a família e os amigos, mas faltava-nos roupa, calçado e comida (uma sardinha era dividida por quatro pessoas e só comíamos frango nos dias de festa).
CJ: Havia censura na localidade onde vivia?
João Menezes: Sim, havia censura nos meios de comunicação. O lápis azul era utilizado para censurar conteúdos considerados subversivos pelo regime. Muitas vezes, as notícias eram manipuladas para servir os interesses do Estado.
CJ: O senhor João conheceu alguém que também tenha sido preso pela PIDE ou que desapareceu?
João Menezes: Sim, tive amigos que foram presos pela PIDE. Era uma realidade assustadora, viver com o medo constante.
CJ: Naquela época, havia consumismo como há agora?
João Menezes: Não, o consumismo não era uma realidade naquela época. As pessoas viviam com o que tinham, e não havia a mesma pressão para consumir produtos e bens materiais como existe hoje em dia.
CJ: O que pensa daquele tempo?
João Menezes: Penso que foi um período difícil e sombrio na história de Portugal. Vivíamos sob um regime autoritário que reprimia a liberdade e os direitos humanos. No entanto, também acredito que essas experiências nos tornaram mais fortes e resilientes como povo.
CJ: Muito obrigado por partilhar estas informações, Sr. João Menezes. Foi muito enriquecedor conhecer um pouco mais sobre esse período da história de Portugal através das suas memórias.
João Menezes: Obrigado pelo convite. Foi um gosto poder contribuir com o meu testemunho.
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